Duplicação. Tão perto, tão longe
Caía o final da tarde em 2 de outubro de 1995. Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso subia ao palanque diante de 3 mil pessoas, às margens da BR-470, no Baú Baixo, em Gaspar. A viagem presidencial ao Vale do Itajaí – a primeira a Santa Catarina em seu governo – tivera um motivo nobre: inaugurar os últimos 25 quilômetros da rodovia, de Gaspar a Navegantes. Mesmo federal, foi pavimentada com 90% de recursos estaduais para acelerar a conclusão que se arrastava por 20 anos. A inauguração não pôs fim à agonia, mas denunciou outra carência. Saturada de veículos, a BR-470 já precisava ser duplicada. Ironicamente, FHC prometeu a duplicação de outra rodovia urgente: a 101. Garantiu que não sairia do governo enquanto não fosse ampliada. Depois de 17 anos, a rodovia ainda passa por obras no Sul do Estado.
A cena se repetiu. Tarde de 9 de junho de 2011. A presidente da República agora era Dilma Rousseff. Encarava mais de mil pessoas no Bairro Passo Manso, em Blumenau. Na primeira viagem ao Estado, entregava 580 apartamentos do Minha Casa Minha Vida a atingidos pela tragédia de 2008. No discurso, disparou: “A duplicação da BR-470 é uma questão de honra”.
Daquela tarde de 1995 até hoje, pelo menos 1,8 mil pessoas morreram em acidentes na rodovia. Hoje, em quase duas décadas de reivindicações, o Vale do Itajaí nunca esteve tão perto da duplicação. No Hotel Himmelblau, às 11h, os ministros dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, e da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, lançarão o edital de duplicação de 12,9 quilômetros entre Belchior, em Gaspar, e Blumenau, correspondente ao lote 3 dos quatro em que foi dividida a rodovia. As licitações dos outros três serão lançadas até dezembro. À tarde, os ministros partem para Jaraguá do Sul, onde lançam o edital da duplicação da BR-280, na sede da Associação Comercial e Industrial.
A BR-470 é o exemplo histórico da negligência. Construída a fragmentos desde a década de 1960, pelo então Departamento de Estradas e Rodagens (DNER), transitou diversas vezes entre a tutela da União e a do Estado. Em 1998, foi concedida à empresa Ecovale, cuja licitação foi cassada no ano seguinte, pelo Tribunal de Contas do Estado, apontando 16 irregularidades no contrato. Os 73,2 quilômetros projetados pelo Dnit para serem duplicados agora, já estavam previstos para serem concluídos até 2008 pela Ecovale. Como contrapartida, em 2000, o governo estadual contratou um projeto de R$ 2 milhões para duplicar 29 quilômetros entre Gaspar e Indaial. Mas as pistas projetadas em concreto armado tornaram-se inviáveis aos cofres estaduais.
LANÇAMENTO DA LICITAÇÃO
- Hoje, no Hotel Himmelblau, às 11h, com os ministros dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, e da Secretaria de Relações Institucionais, Ideli Salvatti
- O edital se refere ao Lote 3. São 12,9 quilômetros da ponte sobre o Rio Belchior à ponte sobre o Rio do Testo, em Blumenau. Inclui a criação do acesso subterrâneo à Itoupavazinha, no Viaduto da Mafisa
- A licitação será feita pelo Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), que permite a escolha mais rápida das empresas. Enquanto uma licitação convencional leva 90 dias, no RDC pode levar um mês
A LONGA ESTRADA DA DUPLICAÇÃO
- 1963/1995 - Rodovia é construída de Blumenau a Rio do Sul, depois até Campos Novos. Até 1981, são feitos 40 quilômetros até o RS. Em 1984 são entregues os 20 quilômetros de Blumenau a Gaspar. Em 1995, fica pronto o trecho até Navegantes
- 1998 - Em abril, a União passa a rodovia ao Estado. Em dezembro, com o Programa de Concessões Rodoviárias, a BR-470 é repassada à empresa Ecovale
- 2000 - O governo estadual cancela a concessão, com suspeitas de irregularidade
- 2001 - A rodovia volta à tutela da União
- 2007 - A duplicação é incluída no PAC. Alardeada para 2008, obra fica para 2010
- 2009 - assinada ordem do projeto executivo
- 2010 - Estudos de impacto e viabilidade ficam prontos. Projeto executivo atrasa
- 2011 - Em junho, Dilma Rousseff diz que “BR-470 é questão de honra”
- 2012 - Projeto executivo atrasa duas vezes. Em maio, ministro dos Transportes divide a obra em quatro lotes. O lote 3 será licitado hoje e os outros três até dezembro
Em defesa da duplicação
Há 12 anos, o Jornal de Santa Catarina e a RBS TV defendem a duplicação da BR-470. Desde 1º de janeiro de 2000 até hoje, 1.355 pessoas foram temas de notícias e reportagens nas páginas do Santa. Todas elas morreram em acidentes que se repetem até hoje
Volume de tráfego
- Planejada para escoar tráfego de 6 mil veículos diários, a BR-470 recebe atualmente a média de 35 mil veículos por dia
Economia
- Grande parte da economia do Oeste e do Planalto chega para a exportação pela BR-470, além da produção industrial e agrícola do Vale que circula rumo aos portos de Itajaí, Navegantes e São Francisco do Sul
- A Federação das Empresas de Transporte de Cargas de Santa Catarina calcula que 40% do volume de cargas do Estado passe pela rodovia
- Mensalmente, são transportadas cerca de 90 mil toneladas de produtos
Fonte: Polícia Rodoviária Federal e Arquivo Jornal de Santa Catarina